Texto de Estudo

Efésios 5:1-2:

1 SEDE, pois, imitadores de Deus, como filhos amados; 2 E andai em amor, como também Cristo vos amou, e se entregou a si mesmo por nós, em oferta e sacrifício a Deus, em cheiro suave.

 

INTRODUÇÃO

Nestes versos da carta de Paulo aos Efésios, temos uma das passagens mais admiráveis e úteis em todo o livro de Efésios. Ela toca no coração da vida cristã. O tema do amor pode ser notado no versículo 2, numa pequena frase: “Andai em amor”. Não poderia haver uma definição mais bonita e direta de como devemos viver enquanto cristãos, em termos de comportamento, do que esse imperativo. Este estudo vem nos chamar a atenção para a vivência disso, conforme o exemplo de Cristo, que tanto nos amou a ponto de se entregar em nosso lugar. Também aprenderemos que aquele que ama ao molde do caráter divino rejeita toda a sorte de obras malignas da carne que são contrárias as reais manifestações daquele que ama. Este estudo vem também a nos confrontar, pois a Palavra de Deus sempre põe em cheque todos os nossos argumentos falíveis e nos faz caminhar pelo caminho perfeito que a mesma nos propõe.

 

O APELO DE PAULO (v. 1)

Este primeiro verso merece um pouco da nossa atenção. Ele faz uma ligação muito importante entre os temas abordados antes e depois dele, é um referencial. Ou seja, após falar sobre a “santidade cristã oposta à dissolução” e antes de falar sobre o “dever de todo cristão de andar em amor e na luz”, Paulo, de forma imperativa, propõe o caminho para que tais objetivos sejam alcançados: “Sede, pois, imitadores de Deus”. Essa questão da imitação não é referida apenas aos efésios, mas também aos coríntios (1 Coríntios 4:14-16, 11.1) e também aos tessalonicenses (2 Tessalonicenses 3:7-9), embora nestes últimos dois exemplos o apóstolo se coloca como exemplo a ser imitado ou daquele que também imita. Paulo usa uma linguagem inteligível ao homem ilustrado da Grécia. A mimesis (imitação) constituía uma parte importante na preparação de um orador. Os mestres de retórica declaravam que a aprendizagem da oratória dependia de três coisas: teoria, imitação e prática.  Ou seja, o apelo de Paulo é que seus ouvintes não apenas conhecessem sobre Deus, mas que de fato o imitassem e vivessem isso na prática: “andai em amor”. Contudo, a questão abordada por Paulo não se refere a alunos que copiam seu mestre, mas a filhos que imitam seu Pai, não qualquer filho, mas como filhos amados e não filhos desobedientes que trazem a ira do Pai sobre si (v.6).

Aquele que é nascido de novo procura imitar as obras do Pai, como uma criança imita o comportamento de seu pai terreno apendendo e crescendo com ele. Eu me lembro de quando meu filho, com menos de dois anos, pegou escondido da gaveta do armário do banheiro uma haste de aparelho de barbear e começou a esfregar no seu rosto. Paulo argumenta que os filhos são como seus pais. Os filhos aprendem pela imitação. Deus é amor (1 João 4:8); por isso, os cristãos devem andar em amor. Deus é luz (1 João 5:8); portanto, os cristãos devem andar como filhos da luz. Deus é verdade (1 João 5:6); por isso, os cristãos devem andar em sabedoria. 

É por isso que o apelo de Paulo, mais do que nunca, se faz necessário aos nossos dias. Numa cultura onde o “ser diferente” predomina e as novas tribos urbanas tem ocupado cada vez mais o cenário social, o convite a imitar Deus parece não ser mais relevante, mas é necessário. Isso vale, infelizmente, para o cristão contemporâneo. Ao invés da igreja se amoldar a Deus, ela tem moldado Deus à sua vontade, as suas doutrinas e aos seus interesses. Se de fato somos “filhos amados” de Deus devemos então nos comportar de maneira tal que demonstremos em nosso viver atitudes que testifiquem disso.

 

O MODELO A SER IMITADO PELO CRISTÃO 

Jesus é o perfeito exemplo a ser imitado pelo cristão. Por quê? Dentre muitas justificativas a principal é: porque ele é o modelo exato de filho amado que imita o Pai. Em certa ocasião ele disse: “Meu Pai trabalha até agora, e eu também” (João 5:17) e ainda “Eu e o Pai somos um” (João 10:30) não apenas na questão da triunidade, mas eram um na maneira de pensar e agir, o Filho não se difere em nada do Pai. É por isso que Paulo segue este referencial, instruindo seus leitores a “andar em amor como Cristo nos amou” porque “Deus é amor” (1 João 4:8), e o Filho andou segundo o exemplo do Pai. "Andai" está no imperativo. Implica movimento e progresso. O mesmo amor, a mesma compaixão, o mesmo ideal de Cristo deve servir de modelo para o cristão. O amor motivador de Deus Pai deve ser correspondido pelo nosso amor filial.  Não é opcional, não é um recurso a ser usado quando necessário; o cristão não escolhe amar hoje ou amanhã, ele ama sempre. “Andai” não está só no sentido imperativo, mas muito mais em uma ação que está acontecendo, está em andamento, faz parte integral do agir do cristão em todo o seu proceder.

 Andar em amor denota uma ação habitual, como Cristo fazia. É fazer do amor a principal regra da nossa vida. Esse amor possui duas características distintas: primeiro, o perdão. Deus amou-nos e perdoou-nos (4:32), assim, também devemos amar e perdoar (5:1); segundo, o sacrifício (5:2). Esse amor não é mero sentimento. Ele tudo dá pelo irmão sem levar em conta nenhum sacrifício por aquele a quem é dedicado. 

O padrão de nossos pensamentos e conduta não deve ser propriamente tudo quanto os homens desejam dignificar com o nome de “amor”, mas deve ser nosso exemplo unicamente aquele amor de Cristo, amor abnegado e que tinha propósito. Em seu grande amor, Jesus “a si mesmo se deu”, submetendo-se voluntariamente a seus inimigos, e em consequência a seu Pai. Esta rendição é genuína. Não lhe foi imposta (João 10:11-15). Entre aqueles por quem Cristo se entregara como oferenda pelo pecado estava também Paulo, o grande perseguidor.  É por isso que o apóstolo não usa o pronome “vós” para se referir a entrega voluntária de Cristo, mas “nós”, incluindo-se como um dos beneficiários de tão grande ato de amor. 

Andar em amor, conforme Cristo andou, implica em deixar de ser egoísta numa sociedade extremamente individualista e ter uma conduta de submissão voluntária a Deus e ao próximo. Todavia, enquanto estivermos seguindo os moldes do mundo isso será impossível. O mundo nos treina para sermos senhores e não servos, a matar o outro e não morrer pelo mesmo, a vivermos as nossas vontades e não a de Cristo. Sabemos, pois, que o bom filho se preocupa em agradar ao Pai, mesmo se preciso for, morrer para este propósito, como Cristo morreu por nós, em amor e obediência ao Pai. 

 

AS CONDUTAS A SEREM REJEITADAS PELO CRISTÃO 

Observem as formas pervertidas do amor, segundo Paulo. No verso 3, ele usou três palavras para descrever essas perversões. Vejamos:

1. A primeira forma de perversão do amor é a “impudicícia”. O que é isso? Essa palavra vem do grego porneia, de onde temos a palavra “pornografia”, e refere-se a todo tipo de pecado sexual, ou seja, a toda relação sexual ilícita, incluindo fornicação, adultério, homossexualidade, lesbianismo, bissexualidade e todo intercurso sexual fora do casamento. Paulo conhecia os perigos que ameaçavam a vida dos seus leitores na sociedade em que eles viviam, por isso, ele fala francamente sobre este problema. Na cultura helênica, a prostituição era uma parte essencial da vida grega, Demóstenes  deixou estampado como a regra de vida comum e aceita: "Temos cortesãs por motivo de prazer; dispomos de concubinas por motivo da coabitação diária; temos esposas com o propósito de possuir filhos legítimos e uma guardiã fiel para todos os nossos assuntos domésticos”.  Dos quinze imperadores romanos que houveram, quatorze eram homossexuais. Infelizmente o cenário parece não ter mudado, pois o que era natural a mais de dois mil anos continua se propagando em nossos dias, talvez com mais força do que outrora. Alguém disse um dia que a nossa sociedade hoje colocaria as cidades de Sodoma e Gomorra no bolso. Por isso a advertência de Paulo ainda é relevante aos nossos dias. 

2. A segunda forma de perversão do amor é a “Impureza”. Essa palavra “impureza” vem do grego akatharsia. Literalmente, essa palavra descreve uma substância que é imunda ou suja, um corpo morto. Também se refere ao refugo, resíduo ou lixo, ou à purulência (pus) que se forma em torno de uma infecção, uma ferida aberta ou ao conteúdo das sepulturas. Essa forma de perversão também está ligada a vida sexual, mas ao que se refere à mesma dentro do casamento. Refere-se aos atos sexuais antinaturais que resultam em perversões baixas e destrutivas. É um tipo de pecado que "amarra o andar em Cristo". São aqueles pecados conhecidos como prazer imerecido, relações sexuais impróprias etc. A vida do cristão deve ser santa em todos os seus atos.  O cristão precisa desfrutar de sua vida sexual de uma maneira pura, sem contaminação.

3. A terceira forma de perversão do amor é a “cobiça”. A palavra “cobiça”, no original grego (pleonaxia), aparece com a ideia de voracidade. Significa, literalmente, um “desejo ávido de ter sempre mais”, uma paixão doentia. É um forte desejo de adquirir cada vez mais, especialmente o que é proibido. 

Paulo afirma que a impudicícia, impurezas e a cobiça sequer deveriam ocupar o pensamento dos cristãos, como convém aquele que anda segundo o padrão divino. Isso quebra um paradigma da cultura helênica, que diferente da cultura judaica, dava muita atenção para o valor do pensamento, para o subjetivo. Segundo as palavras de Jesus “do coração do homem procedem maus desígnios, homicídios, adultérios, prostituição...” (Mateus 15:19). Por isso tais sentimentos não devem ser alimentados dentro de nós e nem sequer serem mencionados.

O versículo 4 vai mais longe: da imoralidade para a vulgaridade. Paulo diz também que há uma perversão sexual que pode se manifestar na linguagem.

1. A primeira perversão sexual que se manifesta por meio de palavras é a conversação torpe. A expressão “conversação torpe” é a tradução do grego aischrotes, e significa: obscenidade ou imoralidade. São os gracejos obscenos ou com segundas intenções, vistos também como uma maneira vulgar de se elogiar alguém. Mesmo que por brincadeira, tais palavras não devem ocupar lugar no linguajar cristão. Mesmo que vivamos em um ambiente em que a literatura, a linguagem e principalmente a música estão contaminados por palavras torpes, não devemos aderir a isso e encarar de forma natural a depravação do sistema social, educacional, cultural e religioso. Muitas vezes não podemos controlar o que ouvimos, mas podemos controlar o que falamos.

2. A segunda perversão sexual que se manifesta por meio da linguagem são as palavras vãs. Estas duas palavras constituem a tradução de uma palavra composta no grego: Morologia. Moros significa “tolo” e Logos pode ser traduzido como “palavra”. Logo, nós temos aqui uma alusão à “conversa tola”. É aquele linguajar que se espera ouvir dos lábios de um tolo ou de um ébrio. São palavras sem utilidade. Tiago nos diz que precisamos estar “prontos a ouvir e tardios para falar” (1:19). O tolo não mede as suas palavras, não pensa antes de falar, aliás, ele quase não pensa, pois fala tanto que não sobra tempo para pensar e o ébrio não se faz entendido, a falta de controle sobre o seu linguajar denuncia a falta de controle que ele tem sobre a sua própria vida. Ao escrever aos colossenses Paulo orienta que “nossas palavras sejam sempre agradáveis, temperada com sal” (4:6), ou seja, não fale demais, nem de menos, mas na medida certa.

3. A terceira perversão sexual que se manifesta por meio da linguagem são as chocarrices. O que significa isso? Esta palavra é muito interessante. Ela vem do grego eutrapelia. Transmite a ideia daquela pessoa que dá uma resposta rápida e de forma engraçada ou jocosa, fazendo uso das palavras de uma forma inteligente, com um duplo sentido. Traz a ideia de um jogo ou disputa de palavras. É aquela pessoa que tem a resposta na “ponta da língua”, não no sentido de solucionar uma questão, mas com o intuito de não ficar para trás numa guerra de palavras, ou seja, “quem fala o que quer ouve o que não quer”. Lamentavelmente as chocarrices têm estado dentro dos lares, das escolas e até dentro das igrejas.  

Todas estas coisas, porém, segundo o apóstolo Paulo, são inconvenientes. Antes, pelo contrário, diz Paulo, que haja ações de graça em nossa boca e em nossa vida. É isso que ele diz em 1 Tessalonicenses 5:18: “Em tudo dai graças, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco”.

 

UM AVISO FINAL

A perversão conduz à punição. Por isso, lemos no verso 5: “Sabei, pois, isto: nenhum incontinente, ou impuro, ou avarento, que é idólatra, tem herança no reino de Cristo e de Deus”. O que Paulo está dizendo é que se nós vivermos assim não estamos salvos, não estamos no Reino de Deus. É melhor examinarem-se si mesmo. Nenhum fornicário, nenhuma pessoa impura ou avarenta, que é idólatra, pois faz do dinheiro o seu deus, tem herança no Reino de Cristo e de Deus. Esse não é o nosso estilo de vida. Que ainda pratica estas coisas não saiu do mundo.

Paulo encerra essa parte dizendo, no verso 6: “Ninguém vos engane com palavras vãs”. Ou seja, não deixe ninguém dizer que você pode fazer isso e ser um cristão. Não deixe ninguém dizer que você pode viver assim e que Deus sempre vai te perdoar. Não deixe ninguém lhe dizer que você está tudo certo, quando você sabe que o que está fazendo é errado! Não deixe que ninguém vos engane com essas palavras vazias. Elas são vazias, elas são sem sentido, eles são inúteis.

“Porque, por essas coisas”. Que coisas? Fornicação, impureza, cobiça, avareza, conversa torpes, palavras vãs e piadas vulgares. Paulo diz: “por essas coisas vem a ira de Deus sobre os filhos da desobediência”. Estas são as coisas que Deus abomina. Não deixem que ninguém vos engane.  Estas não são as características dos filhos de Deus. Pelo contrário, são características dos filhos da desobediência.

E o resultado disso tudo é uma palavra final, que está no versículo 7: “Portanto, não sejais participantes com eles”. Não sejam seus parceiros, não comunguem com eles. Não copie o estilo de vida deles, pois és povo santo ao Senhor nosso Deus.

 

CONCLUSÃO

Como é bom saber que em Cristo fomos filiados a Deus podendo assim desfrutar das riquezas do seu Reino e ter sobre nós os cuidados de um Pai amoroso. Contudo, com os privilégios vêm responsabilidades. Por isso é dever de todo cristão, andar em amor, mas não segundo as nossas paixões e sim como Jesus andou. As nossas palavras, atitudes, decisões devem ser orientadas pelo caráter de Deus manifesto em Cristo, o nosso exemplo a ser seguido. Um pastor disse uma vez que nós temos o grave defeito de dizer ao novo convertido: “Não olhe para ninguém. Nem para o pastor, nem para mim, olhe para Cristo. O pastor erra, eu também erro, então olhe para Jesus”. Ora, somos imitadores de Deus ou não? Se somos, porque temos medo de dizer para as pessoas nos imitarem? Paulo disse: “Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo” (1 Coríntios 11:1). Vivemos em amor ou não? Já é hora de pensarmos seriamente sobre isso, pois o nosso proceder denuncia a quem pertencemos.